O seu Oscar e o cearense
Chagas estavam numa conversa animadíssima, enquanto arrumavam juntos, os pratos
, talheres, copos e tudo o mais que é necessário para um jantar de gala, sobre
a mesa coberta com toalha de renda do norte e enfeitada com flores do campo.
Todos esses “quiprocós”
fizeram seu Oscar recordar os bons tempos, quando ajudava nos preparativos e
depois na recepção de convidados pra lá de ilustres e famosos. Ele ia contando
pro Chagas, que ouvia , pasmo com os conhecimentos e experiências do seu Oscar:
- Lembro de uma vez que
servi o governador Laudo Natel quando ele veio inaugurar o viaduto que o
prefeito Arildo construiu!
- E como era ele? Gente fina
ou todo cheio de “não me toques”? o Chagas queria saber.
- Gente finíssima foi o
vice-presidente Café Filho, continuou o seu Oscar, sem responder a pergunta do
Chagas, todo imerso nas lembranças. E o presidente Jânio Quadros então! Até me
deu um tapinha nas costas e agradeceu quando eu lhe servi um uísque!
O Chagas quis mostrar que,
se não conhecia os famosos do sul, conhecia pelo menos um , de saudosa
lembrança, lá do Ceará. E quando seu Oscar parou pra respirar, antes de
desfilar mais um nome memorável, o Chagas foi logo adiantando:
- Pois eu fui convidado pra
um almoço de Dia do Trabalho, lá no Palácio do Governador, em Fortaleza, nos
tempos do Cesar Cals. Êita festa supimpa, seu!
- Convidado? Estranhou seu
Oscar.
- E não só eu, como todos os trabalhadores que naquela época, estavam fazendo algum
serviço no Palácio do Governador. Era tanta gente, e tinha tanta coisa boa de
se comer, que me dá água na boca só de
lembrar dos quitutes todos! O Chagas se gabou, olhos brilhando.
- Vai me dizer que tinha
peixe... gozou o seu Oscar.
- Tinha bem uns par deles: Matrinchã
ao molho, pirão de cabeça de peixe, traíra frita, assada e cozida, piau, paçoca
de carne seca, galinha a cabidela, chá de burro, cuscuz com leite, buchada, panelada...
- E isso é comida de gente?
Interrompeu o outro, meio ressabiado por não conhecer a maioria desses pratos.
- Das mais melhores! O Chagas
estava entusiasmado, com a boca cheia d’água com a lembrança das iguarias. E os
refrescos? De murici, de graviola, de buriti... Tinha bolo de milho, rapadura,
cocada, doce de caju.
Tinha tantas coisas
diferentes e tão gostosas, que a gente nem sabia por qual comida começar a se
lambusar!
- E foi todo mundo dos
trabalhadores? Perguntou o seu Oscar, já curioso sobre a festança do César Cals.
- E o senhor acha que ia
faltar alguém, numa boca livre dessas? Tinha gente que nem conhecia tudo que
estava em cima da mesa, por nunca ter visto, ouvido falar ou comido. Um cabra
lá, que trabalhava com os marceneiros,
chegou pra mim e disse, com a boca cheia:
- Meu, isso tá bom demais! Até
um tal de guardanapo, de que eu nem gostei muito, eu comi bem uns três!
Publicado
originalmente na
Edição n.º
37
de 29
de novembro de
1996
Edição n.º 1012
Página 02
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