O juiz Sergio Moro, da 13ª
Vara da Justiça Federal de Curitiba, no Paraná, condenou o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT) a nove anos e seis
meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro,
tendo por fundamento a ocultação da propriedade de uma cobertura tríplex no
Guarujá, litoral paulista.
As provas juntadas na
construção da sentença de 238 páginas e 962 tópicos do serão fundamentais para
que o TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) confirme ou não a pena de
nove anos e meio do ex-presidente Lula. A opinião é de gente que entende do
assunto. O TRF-4 é responsável por julgar, em segunda instância, a decisão de
Moro.
A sentença foi baseada na
suposta propriedade do apartamento 164-A, no condomínio Solaris, no Guarujá
(litoral de São Paulo), cujas benfeitorias feitas pelo Grupo OAS são colocadas
pelo juiz Moro como principal prova de benefício de Lula pela construtora. O
ex-presidente, no entanto, não tem escritura do imóvel em seu nome, e sim uma
carta de intenção e um documento sem assinatura. "Não se está, enfim,
discutindo questões de direito civil, ou seja, a titularidade formal do imóvel,
mas questão criminal, a caracterização ou não de crimes de corrupção e lavagem.
Não se deve nunca esquecer que é de corrupção e lavagem de dinheiro do que se
trata", diz Moro na sentença, a qual determina, inclusive, o confisco do
tríplex.
O uso das declarações de
Léo Pinheiro, que mudou o depoimento em abril e disse que Lula seria o
proprietário oculto do imóvel do Guarujá, acusando Lula de ter mandado destruir
as provas que o ligassem ao imóvel, é o principal alicerce da condenação de
Moro, que juntou às provas notícias publicadas pela imprensa e depoimentos de
possíveis inquilinos do ex-presidente.
Segundo entendimento
recente do STF (Supremo Tribunal Federal), a condenação em segundo grau é
suficiente para determinar o cumprimento da pena. Lula espera em liberdade o
recurso, já que Moro evitou pedir sua prisão imediata.
Segundo o ex-ministro do
STJ (Superior Tribunal de Justiça) Gilson Dipp, a delação é apenas um meio de
obtenção de elementos de prova, e não a prova em si. "Tudo aquilo que o
delator disse tem que ser buscado. Ou entrega provas concretas, ou dá caminho
para que se obtenham provas."
"Ele não conseguiu
trazer aos autos uma única prova de que esse imóvel pertenceu ao Lula",
afirma o ex-ministro da Justiça e ex-vice-procurador-geral eleitoral Eugênio
Aragão.
Moro sustentou que não
seria suficiente o exame formal da titularidade ou transferência do tríplex, e
a concessão do apartamento teria ocorrido de forma "sub-reptícia",
com a manutenção da propriedade para "ocultar e dissimular o
ilícito".
Provar a propriedade seria
a fundamentação básica para a decisão em segunda instância — e as provas nem
sempre são tidas como contundentes.
É preciso lembrar decisão recente,
de segundo grau do TRF-4, que anulou a sentença de Moro contra o ex-tesoureiro
do PT João Vaccari, baseada em delações premiadas.
Com um currículo vasto, que
inclui a orientação de doutorado do presidente Michel Temer (PMDB), a fundação
do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo e a inspiração para a criação
da chamada Escola Paranaense de Direito Administrativo, o jurista Celso Antônio
Bandeira de Mello afirma que já esperava esse posicionamento de Moro sobre
Lula. "Ninguém esperava uma sentença, e sim a condenação", diz.
"Ele (Moro) não se comporta como magistrado, mas como um acusador. Ele não
tinha prova e decidiu contra a lei. A propriedade imobiliária (no caso, o
apartamento de Lula no Guarujá) tem que estar registrada. Se isso não é
considerado, não dá para dizer que alguém é proprietário." Bandeira de
Mello destila críticas ao comportamento de Moro — "me surpreendo que não
tenha sido punido", "ele não parece juiz, suas decisões não são
naturais de um juiz, são sempre parciais" — e afirma que apenas decisões
de instâncias superiores podem corrigi-la. "Não se pode confiar que o
Judiciário vá corrigir erros grosseiros", afirma o jurista. "Essa
condenação não para em pé."
"Ele (Moro) coloca
coisas que não têm nada a ver com a denúncia", diz o ex-ministro da
Justiça Eugênio Aragão. "Chama a atenção a estrutura (da sentença). Não
faz referência às testemunhas de defesa, só às de acusação. Quando vai para a
fundamentação, diz em mais de 200 páginas por que ele não é suspeito por julgar
Lula. É mais um esforço de preservação de imagem. São páginas para destilar a
vaidade do juiz para se autopromover e descarregando sua bronca em cima do
réu."
Os juristas também
estranharam as considerações de Moro sobre a defesa de Lula e a afirmação de
que o ex-presidente não provou sua inocência no único depoimento que deu ao
juiz, em maio. "Desde o momento que ofereceu a denúncia, sabia-se que Lula
seria condenado. Quando a defesa tentava argumentar, Moro não permitiu porque
achava que era perda de tempo. Quando tentou sua defesa, Moro cortou-lhe a
palavra. Houve uma extrema má vontade com a defesa", diz Aragão.
Segundo o ex-ministro Dipp
e o ex-procurador Fonteles, nunca houve necessidade de Lula apresentar provas
de sua inocência — cabe ao acusador, no caso o Ministério Público Federal,
mostrar quais são as acusações. "A defesa tem obrigação de apresentar a
contraprova. Testemunha tem que depor, dizer a verdade", diz Dipp. "O
réu só pode trazer a prova se ele levar uma tese de legítima defesa — mas aí
ele admitiu o fato. O ônus da prova cabe à acusação", afirma Fonteles.
De forma que, agora, a
palavra está com o Tribunal!...
Edição n.º 1016
Página 08
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