O que é ser revolucionário? O dicionário explica que revolucionário é aquele
que provoca revoluções, que é favorável a transformações radicais, que é progressista,
inovador. E destaca como sinônimos: agitador e amotinador. E ao se referir a revolução,
explica que é o ato ou efeito de revolucionar ou de revolver, de sublevação, de
rebelião, de revolta, de insurreição, de subversão, esclarecendo que muitas
foram as revoluções liberais do século 19, implicando mudança profunda ou
completa, causando revolução nos costumes, nas artes e nas ciências.
No sentido apontado pelo léxico, o Papa Francisco pode ser considerado revolucionário?
Em recente documento, uma exortação apostólica intitulada “Evangelii Gaudium”
(A alegria do Evangelho), dirigido não só aos fiéis, mas ao mundo e a quem
interessar possa, o Papa Francisco adota uma posição revolucionária,
notadamente para os cânones (padrões e princípios) da Igreja Católica. Nesse
chamado que considero um apelo, o papa engloba as posições que ele tem expressado
nos seus sermões e discursos desde quando se tornou o primeiro sumo pontífice
não europeu dos últimos 1300 anos. Lendo esse documento, é possível entender
que Francisco reconhece estar “aberto a sugestões” para reformar o papado.
“Como bispo de Roma, cabe-me estar aberto às sugestões para que o exercício do
meu ministério se torne mais fiel ao sentido que Jesus Cristo quis dar-lhe e às
necessidades atuais da evangelização”, escreveu o Papa.
Francisco ataca o capitalismo sem limites como “uma nova tirania” e
adverte que a desigualdade e a exclusão social "geram violência" no
mundo e podem provocar "uma explosão". Faz prevalecer “a lei do mais
forte, o mais poderoso come o mais fraco.” Esta cultura “do desperdício” criou
“algo de novo: os excluídos não são explorados, são desperdícios, lixo”,
critica o sumo pontífice. “É a nova tirania invisível”, de “mercado divinizado,
onde reinam a “especulação financeira”, a corrupção ramificada” e a “evasão
fiscal egoísta”.
O chamamento de Francisco na sua exortação apostólica é um reforço na
luta contra a pobreza e a exclusão. Apela aos políticos para que garantam a
todos os cidadãos “trabalho digno, educação e cuidados de saúde”, e aos ricos
para que partilhem a sua fortuna, afirmando que, “tal como o mandamento ‘Não
matarás’ impõe um limite claro para defender o valor da vida humana, hoje
também temos de dizer ‘Tu não’ a uma economia de exclusão e desigualdade. Esta
economia mata”. “Peço a Deus que aumente o número de políticos capazes de
entrarem num autêntico diálogo orientado para sanar eficazmente as raízes
profundas e não a aparência dos males do nosso mundo”. Os planos assistenciais,
que se tornaram moda para disfarçar a miséria, “fazem frente a algumas
urgências, mas devem apenas considerar-se como respostas provisórias”.
Para Francisco a renovação da Igreja não pode ser adiada, devendo
caminhar para “uma saudável descentralização”, aumentando a responsabilidade
dos laicos, que são “mantidos à margem das decisões” e ampliando “os espaços
para uma presença feminina mais incisiva”. Os jovens deverão ser ouvidos na
tomada de decisões, diz o Papa. “Muitas vezes, comportamo-nos como
controladores da graça e não como facilitadores. Mas a igreja não é uma
alfândega, é a casa paterna onde há lugar para todos.” Mas esclarece que a
reforma não passará pela ordenação de mulheres como padres – “não é uma questão
que esteja aberta a discussão” –, ou pela aceitação do aborto, que é uma
questão fechada, fazendo parte dos valores “não negociáveis” da religião
cristã (vida e família, essencialmente), defendidos pelos anteriores Papas. “Não
é progressista” resolver os problemas “eliminando uma vida humana”. Reconhece, no
entanto, que a Igreja Católica “tem feito pouco” para acompanhar as mulheres que
se encontram numa situação que as leva a abortar, sobretudo num contexto de
violação ou extrema pobreza, “onde o aborto se apresenta como uma rápida
solução para as suas profundas angústias”.
Outra idéia forte de Francisco é a de que a sua Igreja não siga um
caminho de ostentação e de preocupação, mas sim uma senda missionária e que vá
ter com quem dela necessite: “Prefiro uma Igreja ferida e suja por andar na rua
a uma Igreja interessada em ser o centro e que acabe enclausurada num
emaranhado de obsessões e rituais”.
Ademais disso, Francisco reafirma que a Igreja não se deve fechar para
ninguém, em palavras que podem ser tidas como relevantes para a questão dos
fiéis divorciados, a quem são negados os sacramentos – ou dos cristãos
homossexuais que foram batizados. “Há portas que nunca se devem fechar. Todos
podem participar de algum modo na vida eclesial, todos podem fazer parte da
comunidade, e as portas dos sacramentos nunca devem fechar por motivo algum.”
Na mira da máfia, notadamente da N'drangheta, a organização criminosa
calabresa mais perigosa da Itália, em razão da sua postura contra a corrupção —
tanto dentro como fora do Vaticano —, o Papa corre perigo e deve zelar pela sua
vida, pois os altos dirigentes destes grupos mafiosos estão nervosos e agitados
com os passos papais.
Nesse contexto, o Papa Francisco é ou não um revolucionário? Encaixa-se
ou não nessa definição? Assim como Jesus, o Cristo, o foi?
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