“A
memória diminui... se não for exercitada.” (Cícero)
Depois da acachapante
derrota da seleção brasileira para a Alemanha por 7 x 1 no gramado do Mineirão,
muito se tem dito que devemos esquecer tal fato, apagá-lo para sempre da nossa
memória.
Penso que não. Ao
contrário, devemos sempre lembrá-lo e refletir sobre ele. É assim que agem as
pessoas inteligentes e interessadas em que tais fatos não mais se repitam ou,
se acontecer de serem repetidos, que o sejam, mas não com a mesma intensidade
ou gravidade. Não é com o esquecimento que vamos apagar o que aconteceu. É
preciso analisar os fatos e saber o que deu errado para tentar corrigi-los e
adequá-los ao seu tempo e lugar, por mais amargos e massacrantes que sejam.
Não é objetivo desta matéria
discutir as razões pelas quais a seleção canarinho frustrou tanto a expectativa
de um povo, até porque o Brasil não é feito só de futebol e para o futebol. O
Brasil não é tão-somente a pátria de chuteiras, como queria Nelson Rodrigues. O
Brasil é mais do que isso, do que uma bola rolando...
O que esta matéria pretende
é mostrar que atitudes como essas de pretender esquecer as derrotas, o que é
desagradável, o que é humilhante, prejudica a história pelo simples fato de não
podermos a ela recorrer porque nos tornamos uma pátria sem memória. A
propósito, nesta última quarta-feira, dia 9 de julho, o estado de São Paulo
inteiro comemorou um feriado. Muito importante, mas pouca gente sabe o que esse
feriado estadual representa! A geração mais antiga, por certo, sabe a razão
desse feriado, até porque viveu, ou teve alguém próximo que viveu os fatos que
a ele remetem. Mas e as mais novas? Sabem a que esse feriado nos remete?
Evidente que não, posto que não há memória para tanto.
Só para lembrar, o feriado do
último dia 9 de julho, que dá nome a muitas ruas, avenidas e túneis em cidades
do estado paulista, comemora a Revolução Constitucionalista de 1932 ou Guerra
Paulista, que foi o movimento armado ocorrido no estado de São Paulo,
entre os meses de julho e outubro de 1932, que tinha por objetivo a
derrubada do Governo Provisório de Getúlio Vargas e a promulgação de uma
nova constituição para o Brasil. Foi uma resposta paulista ao golpe de 1930,
pelo qual Getúlio Vargas assumiu o poder instaurando uma longa ditadura.
Atualmente, o dia 9 de
julho é a data cívica mais importante do estado de São Paulo, pois quem é
paulista considera a Revolução de 1932 como sendo o maior movimento cívico da
sua história, cumprindo registrar que a lei 2.430 inscreveu os nomes de
Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo, o MMDC, heróis paulistas da
Revolução Constitucionalista de 1932, no Livro dos Heróis da Pátria.
Foi a primeira grande revolta contra
o governo de Getúlio Vargas e o último grande conflito armado
ocorrido no Brasil, com um saldo oficial de 934 mortos, embora
estimativas, não oficiais, reportem até 2.200 mortos, sendo que numerosas cidades do
interior do estado de São Paulo sofreram danos devido aos combates. Mas, se São
Paulo, lutando sozinho contra a federação perdeu, ganhou na derrota, porque depois
da revolução de 32, voltou a ser governado por paulistas, e, dois anos depois,
uma nova constituição foi promulgada, a Constituição de 1934.
Mas este é um fato da
história do Brasil que está esquecido e que só não morre em razão dos veteranos
que, por dele terem participado, ainda o revivem. Quantos sabem do mausoléu que
há no cemitério da Saudade em Campinas, reverenciando os heróis que tombaram em
solo paulista para defender o ideal da liberdade contra a tirania da ditadura
de Vargas? O poeta campineiro Guilherme de Almeida, também ele um combatente na
Revolução de 32, e que se encontra sepultado no Mausoléu do Soldado
Constitucionalista de 1932, no obelisco do parque do Ibirapuera, na cidade de
São Paulo, ao lado dos despojos dos jovens conhecidos pela sigla MMDC, numa
mostra do seu amor maior pela abençoada terra paulista, escreveu o poema Nossa
Bandeira, cujos versos estão insculpidos no mausoléu campineiro e do qual
destaco o seguinte trecho: “Bandeira da minha terra, Bandeira das treze listas:
São treze lanças de guerra cercando o chão dos paulistas! (...) Cada lista é
uma trincheira; Cada trincheira é uma glória! (...)”.
Porque os governos não se
preocupam em assegurar que esses fatos sejam transmitidos de geração em
geração? Afinal, a ausência de memória significa repetir derrotas, como vimos,
já que nada aprendemos das experiências vivenciadas. Os mortos não morrem caso
nossas memórias permaneçam vivas com suas lembranças. Assim, podemos
reverenciar nossos ancestrais, nossos heróis, reavaliar as experiências, ponderar
sobre os fatos da vida e, com este acervo, enriquecer o nosso repertório
pessoal e escrever uma nova história. Derrota é lição e com lição se aprende;
mas, com memória, não com esquecimento!
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