sexta-feira, 25 de julho de 2014

Para não esquecer jamais


Há 50 anos, na virada do mês de março para abril, na calada da noite, os militares se empossaram como administradores do Brasil, depondo o presidente João Goulart.
A ditadura militar durou duas décadas.
Que tempo de temores, inseguranças e desconfianças!
Eu frequentava um curso de extensão cultural, para professores, e não concordando com uma aula muito xôxa sobre técnicas de comunicação, tive a infelicidade de criticar o despreparado professor com o comentário: “É por isso que o Brasil não vai pra frente!”
O professor imediatamente parou com a aula e saiu um pouco da sala. Ficou um silêncio atroz.
Uma colega me chamou a atenção, dizendo: “você vai se encrencar, porque o professor é militar”.
Não deu outra! Quinze minutos foram o suficiente para aparecerem, na porta da sala,  três policiais  fardados me convidando para sair da classe. Não atendi os policiais porque na classe uma outra colega professora, que também era advogada, preencheu uma sumária procuração em folha de caderno. Eu assinei e ela foi me representar, na conversa com os militares, lá no corredor.
O clima ficou insuportável. Todos tremeram de medo, temendo uma invasão da classe.
Meia hora depois voltou a colega advogada e comunicou que eu iria receber uma intimação para depor no DOPS – Departamento de Ordem Política e Social em São Paulo.
Realmente, quatro dias depois atendi à intimação. Fiquei quatro horas respondendo perguntas e driblando insinuações do temível Coronel Erasmo Dias, comandante encarregado do inquérito e que demonstrava suspeitar que eu pertencia a alguma célula revolucionária!
(Para quem não se lembra, o Coronel Erasmo Dias é aquele que, comandando um pelotão, invadiu não só a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, quebrando tudo e danificando até a biblioteca, como também invadiu o teatro da universidade, levando muitas pessoas para o DOPS)
Como não descobriram nada que me incriminasse, passei mais só um tempo de castigo, ouvindo os conselhos do coronel. Liberado, fui embora e durante os anos da ditadura militar não emiti opinião política, confirmando o ditado “gato escaldado tem medo de água fria”.
Em julho de 2002, retornei ao prédio do DOPS, que passou a ser um espaço cultural, restaurado sob a administração da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo. Mas, confesso, é difícil entrar ali e esquecer aquela sensação de impotência frente a um poder ditatorial.
Jamais será possível esquecer!








Tom Santos





Edição n.º 945 - página 02


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