sexta-feira, 21 de novembro de 2014

As grandezas do insignificante

A poesia está guardada nas palavras — é tudo que eu sei.Meu fado é o de não saber quase tudo.Sobre o nada eu tenho profundidades.Não tenho conexões com a realidade.Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro.Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas).Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil.Fiquei emocionado. Sou fraco para elogios.




O poeta matogrossense Manoel de Barros se desconectou definitivamente da realidade no último dia 13, aos 97 anos. A notícia me provocou muita emoção!       
Quem, agora, perceberá que fazer “poesia é voar fora da asa”? Quem “descobrirá as insignificâncias do mundo e as nossas”? Quem perceberá que seu “amanhecer vai ser de noite”? Quem vai “carregar água na peneira”? Quem “fotografará o silêncio”? Quem estará “aparelhado para gostar de passarinhos”?
E quem terá “abundância de ser feliz por seu quintal ser maior do que o mundo”? E, por isso, se transformará “num apanhador de desperdícios”? E quem “usará a palavra para compor seus silêncios”?
O poeta  “aprendia melhor no ver, no ouvir, no pegar, no provar e no cheirar”. Ele chegou por vezes “a alcançar o sotaque das origens, e admirava como um grilo sozinho, um só pequeno grilo, podia desmontar os silêncios de uma noite!
E quem (ah, quem?) “pensará em renovar o homem usando borboletas”?
E quem (quem, na verdade?) verá que “um girassol se apropriou de Deus: foi emVan Gogh”?
Manoel de Barros já “sabe quando amanhece ontem”. E agora ele, cuja “independência tinha algemas”, está livre de todos os vínculos terrenos: “livre para o silêncio das formas e das cores”.

Que ele esteja entre girassóis e arco-íris no silêncio do espaço sideral.















Edição  n.º 962 - página 01

Nenhum comentário:

Postar um comentário