sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

O medo do humor



Os pelegos da repressão verde amarela não tinham coragem para entrar atirando numa redação, como os terroristas fizeram na semana passada em Paris. Preferiam o terrorismo sorrateiro, dissimulado: uma bomba aqui, um incêndio em banca de jornais ali, o trivial da covardia sem rosto.” (Sergio Augusto, O Estado de S.Paulo 10/01, C7)


O tablóide semanal “O Pasquim” foi a publicação brasileira mais assemelhada ao francês “Charlie Hebdo”. Com seu humor irreverente e anárquico, “O Pasquim” deu uma roupagem nova à linguagem do jornalismo brasileiro, uma forma mais coloquial à publicidade e causou um forte abalo nos níveis da hipocrisia nacional. Fundado em 1969, circulou até 1991, e sua redação sofreu um atentado a bomba, na madrugada de 12 de março de 1970.
Além de covardes, os terroristas a serviço dos fundamentalistas do regime militar (1964/1985) não primavam pela competência. Quanto aos outros jornais nacionais, eles noticiaram o fato no dia seguinte, com maior ou menor grau de solidariedade à vítima. “Mas nem o mais solidário deles estampou em manchete “Nós somos “O Pasquim”, reconhece o articulista do Estadão.
Em compensação, nos atuais tempos de redes sociais e mensagens instantâneas, as charges e mensagens de apoio às vítimas do “Charlie Hebdo” se multiplicaram ao redor do mundo. Duas “Je suis Charlie” chamam particularmente a atenção: a reprodução da personagem título da tirinha “Charlie Brown”, chorando com a cabeça entre as mãos, e a face de Charlie Chaplin, como Carlitos, em que as lágrimas lhe borram os olhos e mancham o rosto maquiado de branco, sob a legenda “Eu sou Charlie e estou desolado”.

       

O humor satírico, insolente, subversivo e abusado de Jaguar, Henfil, Millôr, Ziraldo, Sérgio Cabral, Luiz Carlos Maciel, Miguel Paiva e Ivan Lessa, entre outros, conhecia bem a falta de humor do regime repressivo. E sofria, além de censura prévia, toda sorte de pressões e constrangimentos, além do desmantelamento das formas críticas de expressão cultural,  porque, como escreveu Roberto Damatta (O Estado de S.Paulo, 14/01, C8), “o maior medo dos radicais não é um outro radicalismo, mas o riso e o humor que carnavaliza e sublima”.







Como pode ser verificado pelas capas reproduzidas aqui, tanto o deboche escrachado da edição nº. 105 do “Pasquim”, como a semelhança da edição comemorativa dos seus 40 anos (com décadas de antecedência!) com a capa da “Charlie Hebdo” que provocou o ataque terrorista na França é incrível!
Embora nunca a manchete “Nós somos “O Pasquim” tenha sido estampada, “O Pasquim” sempre foi Charlie, cheio de humor crítico e de liberdade de expressão, desde a sua fundação no final dos anos 1960.











 Edição n.º 970 - página 01



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