O
título acima mostra uma dificuldade que muitas pessoas sentem quando querem
falar sobre uma pessoa com perda auditiva.
Qual
é o termo certo? Qual poderia magoar? Qual ou quais os mais adequados de se
usar? Neste artigo, procuraremos discutir estas e algumas outras dúvidas
relacionadas ao tema “perda auditiva/surdez”.
Para
ajudar na resposta, há necessidade de uma primeira informação a respeito da
real capacidade de falar de pessoas com perda auditiva/surdez: algumas pessoas
que não ouvem bem não falam porque não escutam os outros falarem e nem a sua
própria voz. Os seus órgãos da fala – pulmões, laringe, pregas vocais, entre
outros - não apresentam qualquer anomalia e podem emitir sons. A constatação
dessa afirmação pode ocorrer ao ouvirmos o choro, a risada ou a tosse de
pessoas com perda auditiva: se fossem mudas, não haveria som ao chorar ou rir.
Portanto, o que provoca a alteração da fala ou sua ausência é a alteração de
audição.
Por
essa razão, já podemos assegurar que os termos “surdo-mudo” e “mudinho” não
estão corretos!
Ainda
tratando de nomenclatura, a dúvida recai sobre qual seria o termo mais
adequado: “surdo” ou “deficiente auditivo”? Quanto a isso não há consenso, mas
sim escolhas que profissionais e pessoas com perda auditiva/surdez fazem, de
acordo com sua concepção do que é ter perda auditiva ou ser surdo.
Eu,
autora deste artigo, por exemplo, me utilizo do termo “surdo” para toda e
qualquer pessoa que tenha uma perda de audição, independentemente de a perda
auditiva ser de menor ou de maior grau na escala existente. E qual a razão para
uma fonoaudióloga, doutora em linguística, utilizar um termo que pode ser
considerado grosseiro ou rude por algumas pessoas? O motivo é minha crença de
que o fato de a pessoa ter perda auditiva faz com que sua experiência de viver
seja apreendida principalmente por meio da visão. Dessa forma, o mundo é
percebido e significado visualmente, o que muda qualitativamente sua maneira de
ser e estar no mundo. Esse modo de compreensão é compartilhado por muitos
estudiosos da área da surdez, do Brasil e do mundo, e por grande parte da
comunidade surda mundial, a partir de uma concepção sociocultural das
diferentes maneiras de se compreender as diferenças étnicas, linguísticas,
sexuais, religiosas, entre tantas outras diferenças existentes em nosso mundo.
O lugar que cada grupo ocupa na sociedade se dá pela afirmação da diferença, e
não pelo seu apagamento dentro de uma homegeinização entre os seres humanos.
Para as pessoas surdas, a melhor tradução dessa experiência visual de estar no
mundo é a existência e o uso da língua de sinais.
Mas
há outra parte dos profissionais da área da saúde e da educação, e inclusive
pessoas com perda auditiva/surdez, que utilizam o termo “deficiente auditivo”
para denominar quem tem perda de audição, ou para se autodenominarem. Com base
em que princípios fazem essa escolha? A partir da concepção de que a perda
auditiva é uma patologia e, como tal, deve ser curada ou, no mínimo,
minimizada, para que quem a apresente possa ser o mais parecido possível às
pessoas que ouvem e falam. Essa é a “concepção clínico-patológica” e ela tem
base em conceitos médicos.
Logo,
o uso de um ou outro termo não é tão inocente quanto possa parecer à primeira
vista, e assim se dá com todas as palavras que utilizamos para designar
pessoas, coisas ou situações. Há sempre um sentido construído a partir das
escolhas que fazemos no dia a dia.
Com
essa pequena introdução aos assuntos relacionados à perda auditiva/surdez,
espero ter colaborado para que possam parar e refletir sobre os efeitos que as
palavras podem causar.
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